sábado, 26 de fevereiro de 2011

A educação pública piauiense e o teatro do circo dos horrores


Marcos F. Lima*
            Sem professores, sem merenda escolar, sem piso salarial, sem carteiras, sem vigias, sem livros suficientes, sem início do ano letivo de 2011... Assim se encontra a realidade da maioria das escolas públicas piauienses. O quadro é desolador e o início do ano foi marcado por insegurança em relação à infra-estrutura de muitas escolas da capital e interior. Escolas cujos tetos desabaram, muros caindo sobre as salas de aula, bibliotecas que despencaram, somadas a falta de compromisso do Governador Wilson Martins (PSB), expuseram à sociedade piauiense o verdadeiro caos em que se encontra a educação pública do nosso estado.
            A situação da educação pública piauiense e a forma intransigente como o governo do estado conduz o debate com os trabalhadores em educação do estado me fez lembrar um romance do célebre escritor português José Saramago. O título da obra, Ensaio sobre a cegueira, não poderia caracterizar melhor o programa educacional implementado pelo atual governo nos últimos oito anos, quando PT e PSB enganaram toda a sociedade piauiense vendendo a imagem de uma escola organizada, na qual alunos e trabalhadores conviviam na maior harmonia e sem enfrentarem nenhuma dificuldade para ensinar e aprender.
            Ensaio sobre a cegueira nos remete a responsabilidade que temos enquanto cidadãos, principalmente nós educadores, em nos manter sempre vigilantes em uma sociedade que a cada dia fecha ainda mais os olhos para suas necessidades mais elementares, e onde nossos governantes ignoram suas obrigações e em muitos casos até o simples cumprimento da lei.
            Neste contexto, não faltam motivos para os trabalhadores em educação terem deflagrado uma greve há mais de 10 dias atrás, e nós, trabalhadores, ainda temos que ouvir do governo, desde o primeiro dia de greve, que o único problema estaria sendo provocado pelos próprios professores e demais trabalhadores em educação, que estariam sendo insensíveis e inconseqüentes ao deflagrarem a greve.
            Mas fica a pergunta para o governador do estado e seu secretário de educação, Átila Lira: é insensível quem se preocupa com a segurança de seus alunos, expostos diariamente a prédios desestruturados e que ameaçam cair sobre as nossas cabeças? Seria inconseqüente quem exige o cumprimento de uma lei que estabelece um salário muito aquém de nossas necessidades, e que ainda assim o governo se nega a implementar?
            O incrível é que o atual secretário de educação, que se faz de desentendido em relação à lei do piso salarial dos professores, foi o mesmo que votou sua aprovação três anos atrás. Mas o pior, por incrível que pareça, ainda está por vir, pois o governo do estado ameaça os trabalhadores com possíveis corte de pontos e demissões dos professores que não melhorarem os índices impostos pelo próprio governo. Ameaçando até mesmo fechar escolas para quem não se adequar a esta proposta draconiana de punir aqueles que já são punidos por terem acesso a um dos piores sistemas educacionais do país.
            Aliás, Wilson Martins e Átila Lira desconsideram que as precárias condições de ensino e os péssimos salários interferem diretamente na qualidade de nossa educação. E o resultado deste verdadeiro circo dos horrores é que Wilson e Átila querem lavar as mãos e punir os trabalhadores pela péssima educação imposta pelo governo.
            Saramago nunca se fez tão presente em terras piauienses, e o modo como encerra sua instigante obra literária ilustra muito bem as questões levantadas até aqui: “Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem.”
            Espero que os trabalhadores em educação do Piauí não fechem seus olhos para esta triste realidade, e que sejamos nós, trabalhadores, responsáveis por uma mudança profunda na forma com que a sociedade enxerga a educação pública brasileira, sempre esquecida pelos nossos (des)governantes. E que neste teatro, os atores invertam seus papéis, não permitindo que o enredo continue a ser o de um circo de horrores, onde as vítimas são punidas com péssimas condições de ensino.
*Professor de História da rede estadual de educação
Membro da CSP-CONLUTAS - Central Sindical e Popular

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